Você consegue reconhecer esses três estados de ação? Tensão, atenção e intenção? Quando você se coloca em ação, é pela reação, com a atenção ou por sua intenção? Saiba que esses estados são distintos entre eles. A quantidade de ação que tomamos por cada um desses estados diz muito sobre o nosso estado de ser. Além disso, cada um desses estados de ação possui diferentes qualidades.
Você age pela reação, atenção ou intenção?
Estava participando de uma aula de Yoga e Movimento com minha muito querida e competente professora Cris Ibiapina quando ela disse a seguinte frase: você se move pela tensão, pela atenção ou pela intenção? Essa frase bateu em mim como uma grande provocação. Até porque já discutimos muito sobre isso aqui no blog. Principalmente sobre os estados de tensão que geram reação mecânica e sobre o estado de atenção. Porém, não tinha me tocado desse terceiro estado de ação pela intenção. Pelo menos não da maneira que o percebi após essa nova provocação.
Já discursei por aqui sobre a necessidade de ter um objetivo e da importância do uso da vontade para realizar o trabalho. No entanto, o fato de colocar a vontade e o objetivo dentro de um estado de ação da intenção fez muito sentido para mim. Assim, quero compartilhar com vocês essa observação tão útil para direcionar qualquer tipo de trabalho de desenvolvimento pessoal que alguém esteja realizando. Afinal, já falamos muitas vezes da necessidade de auto-observação e como isso nunca se torna mecânico. Ao mesmo tempo, auto-observação é algo fácil de se perder dentro de conceitos e fantasias ligadas ao tema. Assim, acredito que essas observações podem ser muito úteis.
O primeiro estado de ação, o estado de tensão.
Neste primeiro estado de ação, o que prevalece é a tensão e a reação. O corpo, por seus dispositivos sensoriais, recebe impressões, um choque exterior, alguma demanda. Ouvimos algum comentário que nos irrita, nos sentimos julgados, avaliados, desprezados. Pode também acontecer o contrário de recebermos um elogio e sentirmos motivados, superiores, orgulhosos. O que interessa aqui é que recebemos impressões pelos órgãos sensoriais como tato, cheiros, gostos, comunicação visual e auditiva que imediatamente trará a qualquer indivíduo o desencadeamento de uma série de reações. Essas reações vão criar automaticamente tensões ou distensões.
Tais tensões ou distensões não são observáveis de maneira tão óbvia como normalmente pensamos. Primeiramente porque muitas dessas reações irão atuar não só no corpo, mas também na mente e no centro emocional. Assim, por vezes é mais fácil observar os pensamentos do que as próprias tensões. Ainda mais difícil é observar a mudança de estado emocional. Até porque tal mudança se for de positivo para negativo virá com raiva, rancor, tristeza, etc. Contudo, tais emoções entorpecem a mente e impedem qualquer ação imparcial. Se a mudança emocional for de negativa ou neutra para positivo, normalmente a vaidade e orgulho impedem de enxergar o que realmente aconteceu. O fato é que ficamos muito mais tempo escravos das próprias emoções do que temos consciência disso.
Uma questão que dificulta observar o primeiro estado da ação da tensão é que estamos tão acostumados a estes estados, tão identificados a eles que nem sabemos mais como os diferenciar. Logo, mesmo que alguém tente se mover para o estado de ação da atenção, terá muita dificuldade em perceber o que lhe está acontecendo. Por isso que um trabalho de corpo se torna fundamental para aprimorar a capacidade de distinção entre os estados de reação. Todavia, é fundamental aprender a mobilizar o corpo para um estado de relaxamento e prontidão.
Gurdjieff tinha o exercício de “sensing” (sentir-se) como um exercício mandatório para o início de qualquer trabalho. Também tinha os seus exercícios de danças e movimentos que cria no praticante essa percepção corporal refinada do jogo das tensões. Por isso disse acima que é necessário antes de tudo aprender a criar um relaxamento com prontidão. Algo que talvez possa ser chamado de “awareness” (consciência situacional).
O fato é que muita gente falha em conseguir realizar a auto-observação justamente por nunca realizar esse primeiro estado preparatório. Falha por não ter aprendido a ter consciência situacional de si. Em outras palavras, é como tentar escrever algo em um quadro negro já todo rabiscado. É preciso primeiro limpar esse quadro para deixar mais claro as impressões no momento em que elas são recebidas. Contudo, no momento em que limpamos um quadro negro velho e muito usado, vamos notar que há sulcos e traços que não somem facilmente. Mas tudo bem quanto a isso. Na verdade isso deixa claro o que são ruídos e o que são os grandes temas que carregamos em nosso corpo, mente e emoções.
Outro erro clássico é achar que esse trabalho preparatório é sobre relaxamento como forma de eliminar as tensões. Algo como se colocar em um estado de sono. Ao contrário, esse estado é sobre eliminar todas as tensões desnecessárias no momento presente. Portanto, se você caminhar pode observar seus próprios pés e observar simplesmente onde estão as tensões. Se você levanta um copo para beber água, você pode observar a força, movimento, direção, velocidade e pressão que coloca ao realizar essa ação.
A prática de Yoga com a Cris me ajudou muito nessa expansão da percepção desse campo de ação das tensões. Quando levamos essa prática para a vida, para além dos exercícios das aulas, é que começamos a entrar no segundo campo de ação: o campo da atenção.
“Tensão ausente ou presente, vem como resposta a um impulso externo. Um choque. Estado mecânico de resposta. Alguém te dá bom dia e você responde grosseiramente e nem nota. Isso porque a resposta vem do seu estado interior e você está totalmente identificado com o próprio estado de tensão “
Segundo campo de ação, o campo da atenção
Quando trabalhamos o campo da atenção também há um ganho direito no estado de presença. A presença cresce a medida que vamos aumentando o campo da atenção. Uma maneira de trabalhar o campo da atenção é pela âncora da respiração. A respiração lhe mostra imediatamente o seu estado interior. Mas ver o seu próprio estado é ver o que se quer e o que não se quer ver. Por consequência, Isso gera novas tensões. Portanto, para vencer esse jogo é necessário aprender a ganhar a atenção sem brigar com a tensão.
Daí mais uma vez se faz necessário voltar ao início desse texto sobre o campo da ação das tensões. Precisamos aprender a trazer o corpo para o estado de tensão necessário ao momento. Nem mais e nem menos. Assumindo que alguma preparação já foi realizada, logo vamos aprendendo que alguma coisa já se modifica quando trazemos a atenção ao campo de tensão.
É importante notar que a atenção deve somente observar e não julgar. Deve registrar, dar vivência em primeira pessoa ao fato presente. Isso por si só já traz ao longo do tempo um novo estado de aceitação. Por outro lado, a atenção com a tensão pode trazer muitos bloqueios. No entanto, bloquear não trará mudança a ninguém. Claro que por vezes é melhor frear um impulso por não ser adequado. Porém, todo trabalho de transformação começa quando a atenção começa a andar junto com a tensão lado a lado. Quanto mais a pessoa vai aprendendo a permitir testemunhar a si mesmo, maior é o seu estado de atenção.
Não devemos ignorar que há sofrimento nesse processo. Alguns desses sofrimentos são pura ilusões e outros muito verdadeiros. Porém, tal distinção é irrelevante no momento em que se apresenta. Como tempo algo mais sólido , mais real começa se apresentar. É o que Ouspensky chama de mordomo ou governanta. Algo muito mais sólido e próximo de um verdadeiro eu que as constantes mudanças de humores dos diversos eus do campo das tensões.
Muitas vezes temos reações explosivas pelo campo da ação das tensões. Todavia, o que importa é manter presente o campo de ação pela atenção. Assim, nenhuma reação do campo das tensões passa mais desapercebido. Na verdade, passamos muito mais tempo tentando manter o campo da atenção presente do que realmente criando transformação interior.
O terceiro estado de ação, o estado de intenção
Este último estágio é definitivamente o que todos almejamos. Porém, nossa mente inferior age como de uma criança, onde o desejo de ser ignora os esforços e trabalhos necessários para atingir tais resultados. Portanto, não devemos perder muito tempo com esse campo de ação a não ser em relação a dois pontos :
- A necessidade de se ter claramente um objetivo dentro do trabalho.
- Aprender a utilizar a cada momento, a cada oportunidade, a cada lembrança de si para direcionar sua vontade cada vez mais em realizar a totalidade de seu objetivo
Acho também que vale uma dica adicional em trabalhar pequenos objetivos que se relacionam a sua grande meta. Por exemplo, alguém se irrita no trânsito. Então pode utilizar o seu estado de intenção para abrir novas possibilidades. Logo, novas possibilidades criam novas reações. Dessa forma um novo padrão pode surgir. O fato de vencer um pequeno hábito é importante para mostrar a si que você tem o poder de realizar quando simplesmente segue o processo com fé, compaixão e esperança. Há uma grande renovação na fé e na esperança quando percebemos que podemos mudar pequenos hábitos.
Nada pode alterar o rumo de sua vida além de sua própria força interior. Para tanto, é preciso compreender que não falta força de vontade a ninguém. Claro que pessoas são diferentes, realizarão trabalhos diferentes e possuem necessidades diferentes. Isso não é uma competição. Porém, o que acontece é que a força de vontade está totalmente fragmentada entre todos os seus diversos eus que habitam o campo do estado de tensão. E é por isso que muita gente sente que fez muita coisa e não sai de lugar nenhum. Pois, ao final estão realizando uma soma zero.
Por fim, faço aqui um convite a vocês para conhecer o perfil da Cris Ibiapina. Ela está abrindo um grupo especial para todas as idades para experimentar a movimentos de Rolfing® e das posturas milenares do Raja Dhee Raja Yoga. Todos os movimentos muito simples, bem fáceis de realizar. O que traz intensidade a essa prática é o engajamento dos órgãos dos sentidos em cada movimento. Dessa forma, é possível aprimorar ainda mais a capacidade de colher impressões sobre si.
Uma ótima semana de estudos para vocês
Lauro Borges